Entrevista com Ary Bucione, consultor da NutriConnection - Abiad

Entrevista com Ary Bucione, consultor da NutriConnection

28 de maio de 2025

1. Quais são os tipos de bióticos existentes e quais benefícios podem proporcionar para a saúde das pessoas?

    Os conceitos e definições do universo de bióticos podem ser divididos em probióticos, prebióticos, simbióticos e pós-bióticos.

    O principal benefício dos bióticos é auxiliar na saúde intestinal, pois possuem propriedades únicas na regulação do trânsito gastrointestinal, normalização e colonização da microbiota. Além disso, um biótico também pode proporcionar benefícios secundários à saúde humana, por exemplo, na cognição, saúde materno-infantil, imunidade, saúde da mulher, doenças cardiovasculares, entre outros. 

    2. Pesquisa recente da IFIC mostrou que a preocupação das pessoas com a saúde intestinal fez crescer o consumo de produtos que fazem parte do mundo dos bióticos. Quais as principais tendências no mercado brasileiro além dessa?

    As questões sobre imunidade e saúde mental se tornaram recorrentes globalmente e a indústria de alimentos também focou na pesquisa e desenvolvimento de produtos para essas tendências. A pandemia da Covid-19 ressignificou a forma como a população conhecia sobre “ser saudável”, além disso, atualmente, os indivíduos – em especial a geração Z – desejam obter um equilíbrio entre vida pessoal e profissional. Segundo matéria publicada no Portal G1 recentemente, o Instituto Nacional do Seguro Social (INSS) recebeu em 2024 cerca de 472 mil pedidos de licença médica oriundos de afastamentos mentais, sendo que 2 a cada 3 casos são de mulheres com idade média de 41 anos. 

    Os probióticos desenvolvidos com benefícios para manejo de estresse, ansiedade, depressão, aumento do desempenho do sistema imunológico e melhora do sono contribuem para as preocupações citadas acima.

    Além disso, os probióticos que auxiliam no desempenho físico, longevidade, manutenção/controle do peso também são grandes tendências para o mercado brasileiro atual.

    3. Existem pesquisas atualizadas sobre o consumo de bióticos no Brasil?

     O Brasil ainda é carente neste tipo de pesquisa. Aqui na NutriConnection nós fazemos estas pesquisas que referimos como sindicalizadas, quando são feitas com temas específicos. Nossas avaliações mostram desde perfil de consumo, potenciais de mercado e tendências.

    Recentemente, a IFF, associada da ABIAD, conduziu uma pesquisa relevante, disponível em seu site. O estudo analisou a percepção dos brasileiros sobre saúde digestiva e o consumo de probióticos. Foram entrevistadas 777 pessoas em setembro de 2024, com margem de erro de 3,5% e representatividade por classe, idade e região.

    Os resultados revelam que 45% dos brasileiros dizem consumir probióticos, mas apenas 28% realmente utilizam produtos que se enquadram na definição técnica da OMS. Isso demonstra uma confusão importante no mercado. Muitos ainda acreditam que alimentos como iogurtes naturais, kefir, kombucha e até tofu são probióticos, quando na verdade não atendem aos critérios exigidos pela Anvisa ou por organismos internacionais.

    Além disso, 49% dos entrevistados relatam intestino irregular, sendo os principais desconfortos os gases (60%), estufamento (37%) e queimação (29%). Ainda assim, a maioria não reconhece esses sintomas como um problema de saúde, apenas como incômodos do dia a dia. O cuidado com o intestino, na maioria dos casos, começa com dicas de familiares, mudanças na alimentação e só tardiamente, envolve ajuda profissional.

    A categoria de probióticos é promissora, mas ainda pouco compreendida. Falta clareza sobre o que diferencia um produto funcional de um suplemento clinicamente validado. Hoje, boa parte do mercado se orienta por percepções subjetivas, o que limita o real impacto que a ciência pode oferecer. É como tentar montar um quebra-cabeça com peças de várias caixas diferentes — a intenção está ali, mas a imagem final ainda não se completa.

    Na NutriConnection, entendemos que a inovação vai além do produto. Está na educação do consumidor, na construção de confiança e na entrega de soluções com base em ciência. Seguimos monitorando esse mercado de perto porque acreditamos que ele representa um dos vetores mais estratégicos para a saúde e o bem-estar do consumidor brasileiro.

    4. Como está a regulamentação desses produtos no mercado nacional e internacional?

    A regularização de suplementos alimentares – que englobam os probióticos – no Brasil, também foi assunto da Edição Especial da Newsletter de Regulatory Affairs da NutriConnection do mês de maio. Com as publicações da RDC 843/2024 e a IN 281/2024, houve um grande impacto mercadológico, principalmente pela intensa atualização que a Anvisa promoveu para a área de alimentos com novas regras, publicações de cancelamento de suplementos no Diário Oficial da União e incorreções em processos de notificações.

    Já na Europa, atualmente as preocupações estão voltadas para a utilização do termo “probióticos” nos rótulos e a falta de harmonização da Autoridade Europeia para a Segurança Alimentar (EFSA). As atualizações estão voltadas na obtenção de uma estrutura regulatória com maior consistência e unificada, colaborando na clareza jurídica, proteção ao consumidor e permitindo constantes inovações por parte do setor alimentício europeu.

    Entre os grandes mercados globais de probióticos estão os EUA. A regularização de produtos probióticos ocorre pelo Food and Drug Administration (FDA), no qual, também são aprovados e comercializados como suplementos alimentares. A garantia de um controle de qualidade mais rigoroso e solicitação de estudos clínicos robustos também estruturam atualmente os caminhos regulatórios para as empresas americanas.

    5. Quais são os desafios que a indústria de alimentos para fins especiais encontra na produção e comercialização desses produtos?

    O Brasil passa por intensas atualizações e o que vemos é uma Agência reguladora mais criteriosa atualmente, por atuar mais rigidamente e através de um controle pré-mercado, dada a necessidade de notificar os suplementos alimentares. 

    O setor regulado exige precisão, respaldo científico e alinhamento com as diretrizes publicadas recentemente. Com regras mais claras, processos bem definidos e exigência de comprovação técnica, o mercado de suplementos tende a ganhar maior confiabilidade.

    6. O que podemos esperar em termos de inovações nesse segmento em curto e longo prazo?

    As inovações no setor de probióticos, tanto no Brasil quanto no cenário internacional, estão evoluindo rapidamente, impulsionadas por avanços científicos, mudanças no comportamento do consumidor e ampliação do conhecimento sobre o papel da microbiota na saúde humana.

    No curto prazo, as inovações se concentram principalmente em formas de entrega que facilitam a ingestão cotidiana. Produtos em formatos como gomas mastigáveis (gummies), shakes, chocolates funcionais, sopas instantâneas, barrinhas de cereais e leites vegetais enriquecidos com probióticos já estão presentes nos mercados mais dinâmicos da Europa, Ásia e América do Norte. Esses formatos visam integrar os probióticos à rotina alimentar de maneira prática, sensorialmente agradável e conveniente, especialmente para públicos jovens ou com baixa adesão ao consumo de cápsulas.

    Já no Japão, a Yakult se tornou um case de sucesso ao oferecer um produto lácteo fermentado com benefícios comprovados à saúde mental, como redução do estresse e melhora da qualidade do sono.

    No setor de cuidados pessoais, há uma crescente incorporação de probióticos e pós-bióticos em cosméticos voltados para a saúde da pele, em especial para consumidores com pele sensível, acne, rosácea e desequilíbrios da microbiota cutânea. Produtos como cremes faciais, loções corporais e desodorantes com culturas vivas ou derivados bacterianos ganham espaço entre as marcas clean beauty e dermocosméticas.

    Além das inovações em formato, há um movimento claro de diversificação das alegações de saúde. Os probióticos já não são mais associados apenas ao bem-estar intestinal. Estudos recentes têm demonstrado seus efeitos positivos em diferentes fases da vida e condições específicas de saúde. 

    No médio e longo prazo, espera-se uma ampliação expressiva das possibilidades de atuação dos probióticos, com foco em Pesquisa & Desenvolvimento. A descoberta de novas cepas e consórcios bacterianos, cada vez mais personalizados, será um dos pilares da inovação. Microrganismos como Akkermansia muciniphila e Faecalibacterium prausnitzii, considerados probióticos de nova geração, vêm sendo estudados por seu impacto em doenças metabólicas, obesidade, imunidade e até autismo.

    Além disso, a tecnologia aplicada à entrega também avançará. Probióticos encapsulados com nanotecnologia, capazes de resistir à acidez gástrica e liberar seu conteúdo diretamente no intestino, já estão em estágio avançado de desenvolvimento. 

    Por fim, destaca-se o avanço dos pós-bióticos — substâncias bioativas produzidas por microrganismos probióticos durante a fermentação — que apresentam maior estabilidade e viabilidade em alimentos processados. Eles permitem o uso em categorias com maior vida útil e com menor risco regulatório, mantendo parte dos benefícios funcionais, mesmo na ausência de microrganismos vivos.

    A inovação em bióticos não se limita ao laboratório. Ela precisa estar presente na jornada do consumidor, aliando eficácia clínica, segurança regulatória e experiência positiva de uso. É nesse equilíbrio que reside o verdadeiro potencial transformador deles.

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