1. Quais são os maiores desafios regulatórios hoje, no Brasil, para as empresas de alimentos para fins especiais?
O Brasil é um país bem consolidado e reconhecido no aspecto regulatório, com boas práticas implementadas, transparência e reconhecimento internacional.
No entanto, há uma alta frequência de mudanças de legislações que possuem impactos nos produtos, rótulos, embalagens, formulações, entre outros aspectos. Para o setor de alimentos para fins especiais, este impacto passa a ser ainda mais relevante, uma vez que boa parte dos alimentos passam por um nível de regularização ainda mais específico, com exigência de registro obrigatório, documentos e comprovações prévias à comercialização, já que podem ser destinados a público-alvo especial (pacientes, crianças, idosos, entre outros).
Portanto, em um cenário em que há muitas alterações regulatórias em curto período, esta categoria de alimentos é afetada de modo mais profundo para cumprimento das adequações, além dos custos envolvidos.
Além disto, vejo que há desafios para o registro nacional de alguns alimentos que já são comercializados em mercados internacionais: a categoria de enquadramento em nossa legislação, a composição específica presente nas normativas nacionais e a falta de alinhamento com legislações de mercados externos geram, algumas vezes, barreiras não-comerciais e menos acesso da população brasileira a produtos.
A comunicação para pacientes sobre o propósito e impacto destes alimentos na saúde das pessoas, a função específica dos nutrientes presentes na composição e sua importância em condições de saúde específicas também são fatores desafiadores para o setor.
Portanto, temos bastante oportunidade de desenvolvimento do cenário regulatório para promover a inovação e o acesso a produtos que trarão benefícios à saúde da população brasileira, e creio que a regulamentação futura sobre alimentos para fins médicos será um passo importante nessa direção.
2. Como manejar o cenário regulatório nacional frente ao internacional?
Quanto mais sinergia o cenário regulatório nacional tiver frente ao internacional, menos barreiras regulatórias serão impostas, facilitando a entrada no país de alimentos importantes, como aqueles para fins médicos destinados a terapias nutricionais especializadas, que já são consolidados em mercados internacionais, por exemplo.
Mas, para chegar nesta etapa, manter um diálogo aberto e transparente com órgãos como a ANVISA (Agência Nacional de Vigilância Sanitária) pode auxiliar as empresas a entenderem as diretrizes atuais e criar espaço para uma conversa produtiva e que favoreça o acesso de nutrição especializada à população brasileira.
A ABIAD já se posiciona na vanguarda deste movimento junto à ANVISA, promovendo conversas com o órgão sobre as demandas do setor e contribuindo ativamente para chegar nos melhores resultados e alinhados ao que já se aplica no cenário regulatório internacional, sempre que possível.
Há de se destacar que recentemente a ANVISA tem sinalizado intenção de convergência regulatória com legislações e referências internacionais, como visto no reconhecimento de Autoridades Reguladoras Estrangeiras Equivalentes (AREE) dada pela Instrução Normativa nº 344/25. Ainda existem oportunidades para ampliação do escopo da norma e das categorias nela abrangidas, mas iniciativas como esta geram otimização de processo, celeridade, maior confiança sobre o cenário regulatório brasileiro e, em última instância, maior probabilidade de investimentos no país.
3. Quais as alternativas que as empresas trabalham em relação às barreiras regulatórias?
É importante atuar como setor, por meio de associações com voz ativa para conversas abertas com órgãos reguladores, de modo a deixar claros os desafios enfrentados e propor sugestões de melhoria ao arcabouço regulatório atual. Mas este é um processo que demanda tempo, priorização e abertura e análise de impacto regulatório bem executado para que o resultado seja positivo.
Enquanto isto, do ponto de vista prático, o que se pode fazer é tentar enquadrar produtos naquilo que há de existente na legislação nacional e, se possível, adaptar formulações para o contexto regulatório brasileiro. Evidentemente, este impacto é alto quando se pensa em empresas multinacionais, com produtos consolidados globalmente, e nem sempre é possível realizar tais adaptações.
Outro aspecto relevante no contexto brasileiro é que a apresentação de dados comprobatórios sobre o que se propõe, seja sobre formulação ou comunicação dos produtos, é cada vez mais exigida pelos órgãos reguladores. Então, neste aspecto, é de suma importância estar munido de informações e análises sobre a segurança e eficácia dos alimentos para que sua regularização seja factível em território nacional.
4. Quais tendências regulatórias e desafios você vislumbra para a inovação desse mercado nos próximos anos?
Posso elencar alguns temas que vislumbro como impactos no contexto regulatório, tais como: inovações em ingredientes e tecnologias, regulação de alimentos plant-based, sustentabilidade e embalagens, transformação digital e acesso à informação aos consumidores.
Mas, pensando no contexto da ABIAD, gostaria de destacar o avanço do tema de alimentos para fins médicos na agenda regulatória da ANVISA, com apoio desta associação.
Considerando a importância da terapia nutricional como parte importante do tratamento, recuperação e manutenção da saúde dos pacientes, criar mecanismos regulatórios que permitam ampliar a gama de produtos disponíveis no Brasil trará benefícios à população e ao sistema de saúde nacional como um todo.
Entendo que o trabalho para atingir este objetivo é complexo, mas de extrema importância e com propósito especial.