<strong>ENTREVISTA COM IGNACIO GARCÍA, CEO da Tree Intelligence</strong> - Abiad

ENTREVISTA COM IGNACIO GARCÍA, CEO da Tree Intelligence

19 de julho de 2022

PANORAMA – Para quem não acompanhou os trabalhos de vocês com a ABIAD, consegue explicá-los resumidamente?

IGNACIO – Ambas as solicitações tiveram o objetivo de identificar stakeholders diversos que fossem relevantes sobre a temática em questão, para poder entender a influência entre eles e as narrativas e posicionamentos sobre o tema.

Para isso, partimos do conceito do que chamo de “pequeno mundo”. Ao invés de ouvirmos o que o “grande mundo” diz, queremos entender o que é falado, por quem é falado, e a quem influencia no pequeno mundo.

PANORAMA – O “grande mundo” é exatamente o que?

IGNACIO – Todo mundo pode postar em mídias sociais, por exemplo, mas nem todos são relevantes e influenciam sobre determinado tema. Nos interessa identificar e monitorar aqueles que são relevantes e influentes.

PANORAMA – E, do ponto de vista mais técnico, como isso funciona?

IGNACIO – Mergulhamos por meio da netnografia, que faz a análise das redes sociais, para identificar o mapa de influência formado por diversos atores, sejam eles pessoas físicas, associações, empresas ou governo. Essa técnica nos possibilita fazer uma análise quantitativa, visual e qualitativa, bem como mergulhar a fundo na temática, nos posicionamentos de cada ator, e identificar quem eles influenciam e por quem são influenciados.

Temos, com isso, uma rede visual, uma malha mesmo, onde cada nó é um ator e os traços são as conexões entre eles com os devidos distanciamentos e agrupamentos que identificam potenciais comunidades de prática.

Veja que, mesmo quem não tem uma atuação em mídias sociais, aparece em nosso mapeamento, porque o mapeamento trabalha a partir de diversas fontes de dados públicos abertos e aponta quem são esses influenciadores.

PANORAMA – Como ler essa rede para entender riscos e oportunidades?

IGNACIO – Primeiro, é preciso entender do que se trata esse pequeno mundo, quais são padrões de relacionamento dentro dele e desse grupo com os demais. Entender onde cada ator está localizado nessa rede.

Há muita diferença de influência de quem ocupa posições centrais na rede e quem ocupa posições periféricas, por exemplo.

Nos dois casos de ABIAD, com o mapeamento em mãos, a Associação conseguiu elaborar e implementar com a LVBA uma campanha de comunicação muito eficiente, de forma a intervir, no bom sentido, nessas redes, e evitar riscos potenciais. Isso porque a rede e a dinâmica de influência estavam bem identificadas, com riscos mapeados e oportunidades de comunicação desenhadas.

PANORAMA – Pelo fato de ser a mesma associação e tratar de assuntos correlatos, pois tanto edulcorantes quanto aminoácidos estão dentro da categoria de alimentos para fins especiais, foi possível identificar diferenças?

IGNACIO – Sem dúvida, apresentaram características bem diferentes entre si. No caso de aminoácidos, não havia vivência científica suficiente para haver um posicionamento bem claro, enquanto o mapeamento de edulcorantes trouxe características mais complexas ao contar com atores claramente contrários aos produtos.

Porém, a rede de edulcorantes estava menos articulada, menos coesa. Esse pequeno mundo tinha mundos ainda menores dentro deles, o que chamamos de comunidades práticas, que são articuladas e possuem posicionamentos próprios, mas nem sempre interagem com outros grupos.

A rede de aminoácidos é mais coesa. Existem basicamente dois clusters, um acadêmico e outro de influenciadores digitais, conectadas por meio de atores que chamamos de brokers. Esses brokers são os mesmos encontrados na rede de edulcorantes.

Assim, apesar das diferenças, observamos que aparecem atores similares em posições similares em ambas as redes. Significa que, na área da saúde, temos realmente pequenos mundos.

Identificamos médicos que chamamos de rising stars, pois não são ainda key opinion leaders ou ocupam altas posições hierárquicas nas instituições, mas estão em posições estratégicas na rede. Pelo fato de ainda não serem tão reconhecidos, mas serem influentes, são importantes e possuem oportunidade de engajamento.

PANORAMA – Uma vez mapeado, o cenário fica definido por quanto tempo?

IGNACIO – As redes que mapeamos não são estáticas. São vivas porque são formadas por pessoas e organizações com pegadas digitais. Oferecemos aos clientes o acesso a uma plataforma proprietária chamada de LivingStakeholders. Essa plataforma possibilita ter uma base de dados, como se fosse um CRM dinâmico, alimentada com informações sobre o que esses atores estão falando, o que possibilita calibrar constantemente a rede, assim como traçar estratégias de comunicação e engajamento e monitorar a evolução das ações implementadas.

Essa ferramenta nos dá um olhar dinâmico e sobretudo sistêmico, podendo abordar a rede desde distintas óticas, seja ela macro, segmentada e até capilar, aprofundado em cada ator.

PANORAMA – Você acredita que esses atores têm noção da influência deles e por quem são influenciados?

IGNACIO – Nem sempre. Os atores, muitas vezes, não têm noção de quem eles influenciam e por quem são influenciados, sobretudo a mais de um passo de separação.

Conhecemos a “Teoria dos Seis Degraus de Separação” que diz que todas as pessoas estão interligadas às outras por um pequeno número de conexões. Quanto mais coesa a rede, mais próxima estão essas conexões e, muitas vezes, os atores não têm a noção de que estão a apenas dois passos do ator central. Essa identificação pode mudar as estratégias de engajamento e comunicação das organizações.

PANORAMA – Você fala em ator em posição central na rede. É importante para as organizações ou pessoas físicas tentarem ocupar essas posições?

IGNACIO – Em teoria de redes, quem está no centro domina e influencia a rede. Mas, um tema muito levantado é que nem sempre a organização precisa ir para a posição central. Às vezes, por decisão, pode querer influenciar quem ocupa a posição central ou posições estratégicas. Cabe aos estrategistas da organização definirem que posição querem ocupar nessa rede.

Um dos motivos é que quem está no centro domina a rede, mas também está sob os holofotes. Há um risco aumentado.

PANORAMA – Quando você fala de “comunidade práticas”, que são micromundos dentro dos pequenos mundos, são o que chamamos de bolhas? Esses atores acabam ouvindo somente o que querem?

IGNACIO – Por ser uma comunidade prática, há algo em comum que devemos identificar. Pode ser formado pela classe médica, por exemplo. Algumas dessas comunidades são mais fechadas em si mesmas do que outras, sendo que, naturalmente, a comunidade cientifica é mais fechada do que os influenciadores digitais.

É possível enxergar por essa ótica de “bolhas”. O interessante é que quando são comunidades fechadas em si mesmas, existe a possibilidade de identificarmos aqueles stakeholders que fazem a intermediação com outros grupos (os brokers).

PANORAMA – Esses brokers são estrategicamente tão importantes quanto os atores centrais?

IGNACIO – Costumo usar a figura de linguagem das avenidas marginais em São Paulo. Você tem as pontes a cada espaço que nos permitem atravessar de um lado a outro dos rios. Quando uma dessas pontes cai ou apresenta problemas no seu fluxo, fica mais difícil de passar de um lado a outro. Os brokers funcionam como as pontes na rede.

Quanto mais pontes se criam, melhor para o fluxo e a dinâmica entre clusters e comunidades diversas.

PANORAMA – Para encerrar, entendo que quando você chama de oportunidades, é possível identificar também riscos futuros aos negócios e agir preventivamente, estou correto?

IGNACIO – Uma vez que afunilamos o pequeno mundo e o entendemos em profundidade, é possível identificar e prever quais temas serão relevantes no futuro. Fazemos isso há bastante tempo com a indústria farmacêutica, de alimentos, cosméticos e agronegócios, entre outros.  Há similaridade em comportamentos que nos permitem identificar tendências de temas dentro de cada indústria e cross-indústria.

Um exemplo atual é em relação aos aminoácidos. O tema teve uma tendência de decréscimo globalmente e o pequeno mundo do Brasil está atualmente falando mais de queratina e Whey Protein. Isso porque os pequenos mundos passaram a falar menos sobre aminoácidos e mais sobre esses outros dois temas, o que influenciou os demais grupos.

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